Vital Health |Qual é a importância de uma boa alimentação na fase de crescimento das crianças?
Carlos Neves | Segundo Davide Carvalho, endocrinologista e presidente da Sociedade Portuguesa para o Estudo da Obesidade (SPEO), é expectável que a médio prazo 30% a 50% das crianças se tornem obesas na idade adulta. A própria Direção-Geral da Saúde indica que "muitas crianças e adolescentes obesos vão permanecer adultos obesos, antecipando desde logo algumas das complicações outrora só observáveis na idade adulta, como a diabetes tipo 2."
É por isso essencial que a alimentação das crianças seja completa, variada e equilibrada, de forma a evitar o excesso de peso e o desenvolvimento de futuras complicações de saúde. Tão importante como ter uma alimentação saudável é ensinar à criança as razões para ter atenção à sua alimentação e incentivá-la a tomar boas decisões.
VH | Que exemplos um pai deve dar ao filho na alimentação?
CN | Na experiência que temos com o projecto "AJDP nas Escolas", as crianças e adolescentes estão bem informados sobre o tipo de alimentação que devem seguir, conhecendo os macro e micronutrientes e os grupos alimentares, quais os alimentos a evitar e a importância de beber água. Os pais deverão permitir às crianças e aos jovens transpor a teoria para a prática, podendo até envolvê-los e pedir-lhes conselhos para as compras de casa.
Segundo os dados do Relatório Anual do Observatório Anual da Diabetes de 2014, na sociedade atual os homens ainda continuam a adotar um estilo de vida menos saudável comparativamente ao sexo feminino, o que se reflete na taxa de prevalência da diabetes tipo II que continua a ser significativamente mais elevada nos homens (15.6%) do que nas mulheres (10.7%). É essencial educar os mais novos para que estes números diminuam progressivamente e mostrar que uma alimentação saudável pode ser um prazer e feita em família, e não um conjunto de regras rígidas que apenas se aplicam aos mais novos.
VH | Quais os cuidados que um pai deve ter na educação e incentivo ao exercício físico?
CN | Tal como com a alimentação, o importante é fazer-se do exercício físico um prazer e não uma obrigação. Dever-se-á começar pelos passeios em família, sempre divertidos e agradáveis, sobretudo agora que o clima começa a colaborar, e aproveitar os parques e a praia. Em seguida, procurar uma atividade física que a criança ou jovem goste de fazer. Há para todos os gostos: indoor ou ao ar livre; de grupo ou individual; com ou sem animais; dentro de água, sobre a terra ou no ar. Gostar do desporto que se pratica é meio caminho andado para que seja realizado regularmente e para que não seja interrompido simplesmente porque "não dá jeito".
VH | O que fazer quando as crianças começam a apresentar sintomas de excesso de peso?
CN | Em primeiro lugar, falar com o médico de família ou com o pediatra. Embora a causa mais provável esteja relacionada com hábitos de vida pouco saudáveis, poderão existir outras causas que devem ser despistadas. De seguida, consultar um nutricionista que indique quais os pontos a melhorar no regime alimentar. E, de acordo com as indicações dadas, alterar a alimentação não só da criança mas de toda a família. É muito injusto para uma criança ter de seguir regras alimentares que mais ninguém na família segue... Finalmente, a prática de exercício físico deve ser incentivada, mais uma vez para toda a família. Sobretudo em casos onde não haja uma rotina de prática de exercício físico, é importante começar devagar e encontrar o que se gosta de fazer.
VH | Que cuidados e atenções especiais deve um pai ter com um filho que tenha diabetes?
CN | Os pais que tenham filhos com diabetes têm uma responsabilidade acrescida, sobretudo enquanto os filhos não são autónomos. O controlo da glicémia é feito através de três fatores: medicação (habitualmente insulina), alimentação e exercício físico. Mas há ainda muitos outros fatores que não controlamos e que também influenciam as glicemias, como as doenças ou as emoções. Os pais deverão então realizar as medições de glicémia antes das refeições e gerir a insulina a administrar consoante esse valor e a contagem de hidratos de carbono na refeição. Deverão ainda estar atentos a situações de hipoglicemia (baixas de açúcar no sangue), uma vez que as crianças têm alguma dificuldade em reconhecer os sintomas associados.
No entanto, e ao contrário do que geralmente se diz, a alimentação não deve ser diferente de qualquer outra criança, devendo ser completa, variada e equilibrada, mas também reservar algum espaço para umas escapadelas. A nível desportivo, a criança pode praticar qualquer desporto que lhe desperte o interesse, embora seja necessário tomar cuidados extra com a alimentação e com a medicação quando o faz.
VH | De que maneira a AJDP pode ajudar os pais a dar o exemplo?
CN | A Associação dos Jovens Diabéticos de Portugal (AJDP) promove diversas atividades desportivas para toda a família, desde caminhadas, com vários níveis de dificuldade, a convívios. A partilha de experiências entre jovens com diabetes e entre os seus familiares é extremamente benéfica, pois permite uma melhor aceitação e, consequentemente, um melhor controlo da sua diabetes. Temos ainda o projeto DiaEuro, em conjunto com o Núcleo Jovem da Associação Protectora dos Diabéticos de Portugal (APDP), que consiste numa equipa de futsal que participará num campeonato europeu para pessoas com diabetes em julho deste ano.
VH | Que tipo de atividades entre pai e filho recomenda para a adoção de um estilo de vida saudável?
CN | Tradicionalmente, o pai é quem mais incentiva os filhos à prática de exercício físico. Fazer algumas brincadeiras ao ar livre, dar pequenos passeios e jogar à bola ou frisbee são boas atividades para realizar a dois. Mais tarde, acompanhar e apoiar um jovem enquanto ele ou ela pratica um desporto também facilita a adoção de um estilo de vida mais saudável. A nível alimentar, também é possível organizar pequenas atividades culinárias, tais como cozinhar pão ou bolos ou confecionar uma refeição completa.
No fundo, quaisquer atividades que tornem a adoção deste estilo de vida mais interessante e divertida serão benéficas, melhorando a qualidade de vida de todos os membros da família.